Artigo - Falta um tema na campanha presidencial: precatórios
A campanha política para eleição do Presidente da República, em 5 de outubro, vem ganhando as atenções do eleitorado, em razão dos relevantes temas que têm sido abordados pelos três principais candidatos: as questões políticas, sociais e econômicas.
Com efeito, os candidatos têm apresentado propostas efetivas sobre educação, saúde, segurança pública, reforma política, reforma tributária, programas sociais, previdência social, meio-ambiente, bem assim sobre questões objetivas como: inflação, taxa de juros, agronegócio, programas sociais, fator previdenciário, reforma previdenciária para o regime geral e o dos serviços públicos, rede hospitalar, "importação" de médicos, aborto, união de pessoas do mesmo sexo, criminalização versus legalização das drogas, responsabilidades penal e, ainda, redução do número de Ministérios, burocracia, pré-sal, situação da Petrobras, contabilidade pública "criativa", logística dos transportes, financiamento pelo BNDES de obras noutros países etc. Entretanto, nenhum dos candidatos abordou, até o presente, a tormentosa questão dos precatórios, que interessa a milhares de credores dos entes públicos.
A União, os Estados e os Municípios, em milhares de casos, não reconhecem créditos líquidos e certos de pessoas físicas e jurídicas, forçando-as a pleitear o reconhecimento de seus direitos perante a Justiça. Com a decisão final a favor dos particulares, após decorridos muitos anos, a Justiça expede os precatórios, que são ordens de pagamento contra o ente público devedor. Tais pagamentos são custeados por dotações orçamentárias específicas, mas os Orçamentos nunca alocam os recursos necessários, tornando as decisões da Justiça ineficazes. Infelizmente, o Congresso Nacional contribuiu para o agravamento da questão, aprovando emendas constitucionais que, desrespeitando as decisões judiciais, estabeleceram três vergonhosos calotes aos credores.
A Constituição de 1988 estabeleceu, no art. 100 (caput e dois parágrafos), que tais pagamentos devem ser efetuados na "ordem cronológica da apresentação dos precatórios". E prescreveu tratamento independente para os precatórios relativos aos créditos de natureza alimentícia.
Todavia, por pressão do Ministério da Fazenda e Secretarias de Fazenda dos Estados, foi incluído, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o art. 33, para autorizar que "os precatórios judiciais pendentes de pagamento na data de promulgação da Constituição" fossem pagos em prestações anuais pelo prazo de até oito anos.
Foi o primeiro calote imposto aos credores, com violação à coisa julgada. A Emenda nº 30/2000 acrescentou ao ADCT o art. 78, que impôs aos precatórios acumulados e não pagos até a data de sua promulgação (13/09/2000) um novo parcelamento compulsório em até dez anos. Foi o segundo calote.
Prosseguindo no desrespeito aos direitos dos credores, o Congresso promulgou a Emenda nº 62/2009, para dispor sobre precatórios em 7 artigos, 34 parágrafos, 26 itens e 6 alíneas, formando um emaranhado burocrático contra os credores e agredindo a Justiça, para, afinal, instituir um "regime especial de pagamento de precatórios", o terceiro calote. E, numa demonstração da criatividade da burocracia estatal para superar as barreiras da ética e da sensatez, a Emenda criou o imoralíssimo leilão do "quem aceita menos?", no qual os credores mais necessitados foram coagidos a aceitar, por meio de lance, a redução de seus créditos, para obter "sucesso", isto é, receber o restante a que tem direito por decisão judicial.
Em 2011, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional o parcelamento, em até dez anos, prescrito pela Emenda nº 30/2000, por violar "o direito adquirido do beneficiário do precatório, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada" e "atentar contra a independência do Poder Judiciário". Noutra magistral decisão, o STF julgou inconstitucional a parte nociva da Emenda nº 62/09, por violar os princípios constitucionais que garantem a isonomia, o direito adquirido, o respeito à coisa julgada e a separação dos poderes. O Relator, Ministro Aires Brito, considerando adequada a qualificação de "emenda do calote" decidiu que "fere o princípio da moralidade" a regra do "quem aceita menos". E o então Presidente do STF, Ministro Joaquim Barbosa, acentuou que "impor ao credor que espere pelo pagamento por um tempo superior à expectativa de vida do brasileiro retira por completo a confiança na jurisdição e sua efetividade".
Afora regras concretas para a alocação de recursos em montantes adequados ao pagamento dos precatórios, nos orçamentos anuais, inclusive com vinculação de determinadas receitas, poderia ser admitida a cessão dos precatórios para a liquidação de débitos fiscais de exercícios anteriores, mas de outros contribuintes. De qualquer forma, é de se esperar que os candidatos à Presidência da República apresentem propostas para a solução dessa tormentosa questão.
Antonio Oliveira Santos
Presidente da Confederação Nacional do Comércio, Bens, Serviços e Turismo - CNC